António Egas Moniz
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António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz (Avanca, 29 de Novembro de 1874 — Lisboa, 13 de Dezembro de 1955) foi um notável médico, neurologista, investigador, professor, político e escritor português. Partilhou, em partes iguais, o Prémio Nobel da Medicina com Walter Hess (1881-1973) atribuído em 1949.
Nascido António Caetano de Abreu Freire numa família da aristocracia rural, seu tio e padrinho, o padre Caetano de Pina Resende Abreu Sá Freire viria a insistir mais tarde para que a seu apelido fosse adicionado Egas Moniz, em virtude da sua família descender em linha directa de Egas Moniz, o aio de Dom Afonso Henriques.
[editar] Formação e actividade académica
Completou a instrução primária na Escola do Padre José Ramos e o Curso Liceal no Colégio de S. Fiel, dos Jesuítas. Formou-se em Medicina na Universidade de Coimbra, onde começou por ser lente substituto, leccionando anatomia e fisiologia. Em 1911 foi transferido para a recém-criada Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa onde foi ocupar a cátedra de Neurologia como professor catedrático. Jubilou-se em Fevereiro de 1944.
Egas Moniz contribuiu decisivamente para o desenvolvimento da medicina ao conseguir pela primeira vez dar visibilidade às artérias do cérebro. A Angiografia Cerebral, que descobriu após longas experiências com raios X, tornou possível localizar neoplasias, aneurismas, hemorragias e outras mal-formações no cérebro humano e abriu novos caminhos para a cirurgia cerebral.
As suas descobertas clínicas foram reconhecidas pelos grandes neurologistas da época, que admiravam a acuidade das suas análises e observações.
[editar] Prémio Nobel
Os seus trabalhos sobre Angiografia Cerebral foram premiados em 1945 pela Faculdade de Medicina de Oslo, Noruega. Quatro anos depois, foi-lhe atribuído pela Academia Sueca o Prémio Nobel da Medicina, pela descoberta da relevância da lobotomia pré-frontal no tratamento de certas psicoses.
[editar] Actividade política
Egas Moniz teve também papel activo na vida política. Foi fundador do Partido Republicano Centrista, dissidência do Partido Evolucionista; apoiou o breve regime de Sidónio Pais, durante o qual exerceu as funções de Embaixador de Portugal em Madrid (1917) e Ministro dos Negócios Estrangeiros (1918); viu entretanto o seu partido fundir-se com o Partido Sidonista. Foi ainda um notável escritor e autor de uma notável obra literária, de onde se destacam as obras "A nossa casa" e "Confidências de um investigador científico".
[editar] Angiografia cerebral
Inicialmente designada por encefalografia arterial e por radioartériografia cerebral, a angiografia cerebral associa a visualização radiológica do fenómeno circulatório in vivo com recurso a uma solução miscível com o sangue e de contraste aos raios X à localização de precisão de tumores cerebrais. Foi uma técnica desenvolvida por António Egas Moniz com a colaboração directa de Pedro Almeida Lima (1903-1985). Os trabalhos experimentais foram desenvolvidos nos Serviços de Neurologia e de Radiologia do Hospital de Santa Marta (antigo Hospital Escolar), no Instituto de Anatomia Normal da Faculdade de Medicina de Lisboa (dirigido pelo Prof. Henrique de Vilhena) e no Instituto Rocha Cabral (dirigido pelo Prof. Ferreira de Mira). Os primeiros resultados foram apresentados em Paris em 1927. A angiografia cerebral acabou por despoletar um conjunto de outras investigações por parte de outros investigadores portugueses - criando-se uma autêntica Escola Portuguesa de Angiografia - que usavam o mesmo princípio mas aplicado a outros departamentos orgânicos como por exemplo a angiografia dos membros (Reinaldo dos Santos, Augusto Lamas e José Pereira Caldas), a aortografia (Reinaldo dos Santos, Augusto Lamas e José Pereira Caldas), a angiopneumografia (António Egas Moniz, Fausto Lopo de Carvalho e Almeida Lima), a linfangiografia (Hernâni Monteiro, Roberto de Carvalho, Álvaro Rodrigues e A. de Sousa Pereira), a venografia (João Cid dos Santos), a flebografia portal (A. de Sousa Pereira, Melo Adrião e Lino Rodrigues) e a microangiografia hepática.
[editar] Leucotomia pré-frontal
A leucotomia pré-frontal, segundo Lobo Antunes (2001), «continua ainda hoje a ser motivo de controvérsias, muitas vezes alimentadas mais pelos preconceitos e pela ignorância de quem a ataca do que por uma interpretação explicativa rigorosa, que coloque a descoberta de Moniz na correcta perspectiva histórica». De facto, a leucotomia pré-frontal não foi propriamente uma novidade histórica. A ideia de operar cérebros sempre fez parte da intuição médica de curar desde há milhares de anos. Trepanações cirúrgicas eram já praticadas há mais de quatro milénios, quer na Europa quer no Norte de África, para tratamento de várias afecções. Na Idade Média, por exemplo, os curandeiros fizeram diversas tentativas de operar o cérebro na ânsia de procurar a mítica «pedra da loucura». Já no princípio do século XX, o neurologista Vladimir Bechterew (1857-1927) defendeu a ideia de que a cirurgia podia desempenhar um papel de relevo no tratamento de certas doenças. Depois das suas tentativas cirúrgicas no tratamento dos estados parkinsónicos, e a partir de 1933, Egas Moniz dedica-se à reflexão sobre uma técnica cirúrgica capaz de curar certas psicoses. Rompendo com as tradições psiquiátricas, e em contradição com as concepções psicológicas dominantes no seu tempo, Egas Moniz fundamenta a sua ideia essencialmente em duas teorias – a teoria do neurónio do histologista espanhol Santiago Ramón y Cajal (1852-1934) e a teoria dos circuitos sinápticos preferenciais, paralela à reflexologia do médico e fisiologista russo Ivan Pavlov (1849-1936). Despende também muitas horas no estudo dos doentes com lesões dos lobos frontais destruídos por tumores ou traumatismos, uns da sua observação directa, outros relatados por vários autores. Debruça-se especialmente sobre a história clínica de um doente, ao qual o famoso neurocirurgião norte-americano Dandy tinha amputado grandes porções de ambos os lobos frontais para ter acesso a um meningioma (tumor benigno) que eles encobriam. Por conseguinte, todas as concepções teóricas, mais ou menos documentadas em fundamentos anatómicos, fisiológicos e clínicos, procuravam examinar o problema com imparcialidade e sob diversos aspectos. Por outro lado, esta tentativa de tratamento cirúrgico surge num panorama em que a terapêutica psiquiátrica se revelava pobre e infrutífera, pois a era psicofarmacológica só viria a entrar em cena nos anos 50, do século passado. A ideia de Egas Moniz em desenvolver uma técnica cirúrgica aplicada ao tratamento de certas doenças psiquiátricas certamente não encontrou nesta terapêutica uma fonte de inspiração nem tão pouco de comparação. Quando Moniz se refere à leucotomia como uma tentativa «ousada» e «temerária», ele fá-lo consciente que a sua ideia iria ser recebida com as máximas reservas no mundo psiquiátrico, principalmente porque a psiquiatria vivia nessa época um hiato psicanalítico em que as ideias neuro-organicistas eram fortemente contestadas. O médico Luís Cebola, ex-director da Casa de Saúde do Telhal, refere no seu livro Psiquiatria Social, publicado em 1931, que «em Portugal, todos o sabem, porque todos podem constatá-lo, não há nada, absolutamente nada que possa classificar-se de realização séria, de prática proveitosa em benefício dos pobres doidos que por aí abundam». Todo o movimento humanitário despoletado por Phillipe Pinel durante a Revolução Francesa era muito preciso. Mas igualmente se torna inconstestável que o avanço da psiquiatria portuguesa, em particular, era de uma lentidão assustadora. Testemunhos como os apontados revelam bem quanto, na época de Egas Moniz, pouco mais se podia fazer do que aguardar. Júlio de Matos, um dos grandes alienistas portugueses do início do século XX, destaca-se com outro testemunho. No seu livro Elementos de Psychiatria queixa-se que «em Portugal, a falta de manicómios em número suficiente é ainda uma das causas das admissões inoportunas ou tardias. Sempre cheios, os manicómios de Lisboa e Porto não podem abrir as suas portas a quantos lhes pedem tratamento; e assim, os doentes esperam semanas, meses e às vezes anos um lugar, que só vêm a conseguir nas... secções de incuráveis». Quando, no seu livro, tenta abordar os aspectos da terapêutica, ficamos nitidamente desanimados com a pobreza dos recursos. Nessa época os mais variados artifícios da imaginação tentavam suprir as dificuldades sentidas na forma de tratamento dos doentes mentais.
[editar] Diferenças entre leucotomia pré-frontal e lobotomia frontal
Leucotomia pré-frontal e lobotomia frontal são duas técnias absolutamente distintas. Leucotomia préfrontal (Egas Moniz, 1936) - do grego leuco = branco + tomos = corte - significa corte da substância branca localizada no região préfrontal do cérebro. Este corte é feito através de um pequeno instrumento desenvolvido por Egas Moniz designado por leucótomo.
Por outro lado, lobotomia frontal foi uma técnica desenvolvida por Walter Freeman (1895-1972) e James Watts (1904-1994) e amplamente executada nos EUA por estes dois cientistas (do grego lobos = porção, parte + tomos = corte, ou seja, corte do lobo frontal). O instrumento cirúrgico usado era uma espécie de picador gelo e o acesso era transorbital.
[editar] Investigadores portugueses colaboradores de Egas Moniz
- Abel Alves
- Abel Cancela de Abreu
- Acácio Cruz e Silva
- Aleu Saldanha
- Amândio Pinto
- António Carvalho
- António Martins
- Arnaldo Dias
- Cancela de Abreu
- Carlos Vidal
- Carneiro Pacheco
- Diogo Furtado
- Eduardo Coelho
- Fausto Lopo de Carvalho
- Fernando de Almeida
- João Cândido Oliveira
- João Lobo Antunes
- Joaquim Imaginário
- José Rocheta
- Lídia Manso Preto
- Luís Pacheco
- Pedro Almeida Lima
- Romão Loff
- Ruy de Lacerda
- Vitor Lacerda
[editar] Bibliografia de Egas Moniz
- Bibliografia de Egas Moniz (compilação apresentada em formato pdf da autoria da Casa Museu Egas Moniz)
- Bibliografia científica e literária de Egas Moniz. A Medicina Contemporânea, ano LXXII, número 12, Dezembro de 1954, pp.651-685 (esta compilação é da autoria do Dr. António Augusto Fernandes)
[editar] Bibliografia sobre Egas Moniz
Edições comemorativas
- A revista A Medicina Contemporânea dedica o seu número 12 do ano LXXII (Dezembro de 1954) ao Professor Egas Moniz, em comemoração do seu octogésimo aniversário com vários artigos originais sobre a vida e a obra do homenageado.
- A revista da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa (n.º3, Maio-Junho 2006) publica um conjunto de intervenções a propósito do Cinquentenário da morte do Professor Egas Moniz (disponível aqui)
Artigos
- Fernandes, B. Egas Moniz, pioneiro de descobrimentos médicos. Lisboa: Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, 1983
- Serra, I. & Maia, E. Egas Moniz e a investigação científica. in José Pedro Sousa-Dias (coord.), Estudos sobre a Ciência em homenagem a Ruy E. Pinto. Alemanha: Instituto Rocha Cabral e Shaker Verlag, 2006, pp.115-128
[editar] Ligações externas
- Biografia Egas Moniz (inglês)
- Biografia em português, de "Vidas Lusófonas"
- Centro de Gestão e Pesquisa Documental Egas Moniz
- Blogue de Macieira-Coelho sobre Egas Moniz
- Blogue sobre Egas Moniz
- Estudos sobre a leucotomia pré-frontal